segunda-feira, 6 de outubro de 2008

A BELA E A FERA OU A FERIDA GRANDE DEMAIS

"Bem, então saiu do salão de beleza pelo elevador do Copacabana Palace Hotel. O chofer não estava lá. Olhou o relógio: eram quatro horas da tarde. E de repente lembrou-se: tinha dito a "seu" José para vir buscá-la às cinco, não calculando que não faria as unhas dos pés e das mãos, só a massagem. Que devia fazer? Tomar um táxi? Mas tinha consigo uma nota de quinhentos cruzeiros e o homem do táxi não teria troco. Trouxera dinheiro porque o marido lhe dissera que nunca se deve andar sem nenhum dinheiro. Ocorreu-lhe voltar ao salão de beleza e pedir dinheiro. Mas - mas era uma tarde de maio e o ar fresco era uma flor aberta com o seu perfume. Assim achou que era maravilhoso e inusitado ficar de pé na rua - ao vento que mexia com os seus cabelos. Não se lembrava quando fora a última vez que estava sozinha consigo mesma. Talvez nunca. Sempre era ela - com outros, e nesses outros ela se refletia e os outros refletiam-se nela."


Trecho do Conto de Clarice Lispector do livro a Bela e a Fera


Silvia

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